Ode à Tristeza

Um dia, escrevi que tinha pena da tristeza, porque além de ser sempre triste, toda a gente a sacode, para onde pode, contando que não fique.
Que quase ninguém a tenta perceber, quando é ela que permite que se perceba quase tudo. Foi proscrita por uma humanidade absurda, que só aceita prisões feitas de emoções boas.

Maltratada por todos, nas lhe resta mais nada, senão aprender a ser ainda mais triste.
Há pelo menos um consolo em saber que a propensão para a tristeza, tem raíz nos pensamentos mais fundos, que o emaranhar do conhecimento é o mesmo condutor que produz a luz e a escuridão.
Digo, mas não acredito, que se fosse pessoa mais simples, teria menos obstinadas tristezas.
Mas depois, seria incapaz de me deleitar no coração de um homem grande, encarcerar-me dentro de um livro, deleitar-me na espuma das grandes metáforas, comover-me na pequenez de um poema que te diz tudo, com tão pouco, como?
Incapaz de sentir nas veias os acordes de um piano triste, ou pressentir num só olhar, a densidade de um carácter, ver árvores e intuir que são enciclopédias verdes, dançando há anos nas flutuações do vento, fornecendo oxigénio para as nossas convulsões . Como?
Que maldição será maior, a de assumir que há capítulos no livro da vida que a tristeza comanda, ou abandonares-te à vulgaridade de uma corrente de ar, vivendo só de ser sacudido?
A tristeza tem esse dom, que o amor desdenha.
A tristeza é que em estica os lençóis à noite para a inteligência planar. Fazem conchicha, trocam segredos, afagam-se, fazem tertúlias, só para adubar as dúvidas, conspiram nas concavidades da alma, produzem interruptores próprios que fazem pequenas faíscas na escuridão.

A tristeza adora uma mente inteligente. É como ser dono de uma orquestra, capaz de produzir concertos de improviso.
A tristeza sabe que a inteligência produz questões e ela aproveita-se. A inteligência tem uma certa vaidade no conhecimento, e tendo interlocutor, anima-se, anui com a cabeça pesada, pede-lhe que não pare, que lance, que a invade, que a penetre:
– Por amor de Deus, pergunta-me tudo, mas não pares!

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