Avô Celestino

Em todos os velhos há um bocadinho do meu avô.
Quando estou num café mato saudades tuas a olhar para os velhos nas mesas do lado.
Em mim, quase não reconheço nada teu para além da falta imensa que me fazes.
Mas um dia, vou ser uma cópia de ti.
E agora esta quadra, que pouco mais enquadra, que a maldade do suplício das ausências. Custa-me um bocado.

O natal não tem galhos fortes que chegue para pendurar nos ramos das árvores, as bolas imensas das coisas que ficaram por dizer. Já estás longe há tanto tempo, mas temos honrado a sala e a cerimónia, parte do natal ainda és tu.

Este anos seremos 23. Ias gostar de conhecer a Luzinha, a Teresinha e o António. E soubesses o quanto o Filipe gosta de plantas ias dizer que eu tinha acertado na fotosintese.

Perdoa-nos avó Margarida mas a melhor coisa que trouxeste para a nossa família foi o homem com quem escolheste casar.

Há uns dias estive quase para abraçar um senhor na esplanada. Se ao menos nos deixassem saldar nos vivos as saudades que temos dos mortos.

Não havia nada que chegasse ao calcanhar da tua mesa de queijos. O de Nisa é o teu preferido, repetias a mesma frase inaugural todos os jantares. Sabes, nem me lembro muito dos teus dizeres proféticos ou das tuas citações, o que mais nos ensinaste foi a energia do presente e a tua falta de exigência, tão generosa, em relação a cada um de nós.

É esse o material da saudade, a tranquilidade de sermos só o que somos e de só isso importar.

Nunca mais olhei para o natal da mesma forma, desde que o meu menino Jesus partiu do meu presépio.

Falta-me essa fé que tu tinhas nos homens. Falta-nos tu, esse homem de maneiras simples, essa mesa de queijos e o meu avô.