Pare, Escute e Olhe

Nem todas as mudanças são para toda a gente.
E a maioria delas, faz-se apenas com o fim de algo que se demora há tempo de mais. Estas são talvez as mais duras porque pressupõem a quebra da habituação.

Não falo dos vícios, porque há relações que ardem mais que ponta de cigarro. E há trabalhos que nos deviam pagar uma choruda indemnização só pelo fracasso dos sonhos prometidos.
Mas porque é que as pessoas se demoram tanto no que lhes faz mal?
Será o risco da mudança tão assustador que há quem prefira assegurar o mal que já conhece?

Nunca consegui demorar-me muito onde não era feliz. O tempo é o único valor que nunca nos é ressarcido.

Do que sei da mudança, é que ela começa sempre como um corpo interior que deixa de ter posição, com noites de insónia, um vazio parasita que não descola quando lavamos a cara, que não se despe quando nos desembaraçamos do peso da roupa, nem se afoga no fundo de um copo de vinho, por muito grande que seja a sede e a garrafa.
E há quem viva assim, assumindo que a dor continuada é um bibelot interior.
E depois há os outros, aqueles que a sacodem, que a escutam, que escrutinam as entranhas da dormência, e que sem medo de se afogarem nas suas próprias dores, as puxam cá para fora.
Sentam-nas no banco dos réus da consciência e lançam-se no julgamento mais honesto das suas pretensões.
É violento, mas tão benéfico, que basta experimentar uma vez para ficar viciado no procedimento.
Não vale a pena fingir que não se sente, não é boa tática desenvolver processos de apatia, numa vida que se quer vivida da forma mais acordada.
Sempre que sentir que precisa de mudar. Pare, escute e olhe. Observe-se de dentro para fora, sem medo de tratar as dores por tu.
Elas só doem mesmo, porque são tuas, lembre-se disso.
E quando tiver muito medo de mudar, projecte-se para frente e veja com nitidez, o que será de si, se tudo permanecer igual.

“Somos o que fazemos, mas somos, principalmente, o que fazemos para mudar o que somos.”
Eduardo Galeano