Solidão

Quando ia a entrar nos perdidos e achados da escola das minhas filhas, uma senhora, agarra-me no braço e sussurra-me ao ouvido: Gosto tanto, mas tanto, do que escreve, quando é que vai falar sobre Solidão?
Fiquei a pensar no que aquela senhora me tinha dito.
Acho que nunca falei muito sobre o assunto porque nunca o vivi verdadeiramente. Não, essa solidão que nos espalma no fundo de um túnel apertado, não dessa solidão que dói só de respirar. E não, da solidão de estar rodeado de vazios, ao lado de gente, que se fez nossa sem querer. Conheço-a dos filmes, dos livros e das histórias vizinhas. E se puder, gostava de nunca a trincar. Nem ao de leve. Porque dizem que esta solidão se cola como um edredon de velcro à alma. Porque é o pior tipo de doença. Porque danifica a esperança, molesta o carácter, violenta o espírito e despe o corpo da energia, que ele precisa para se sentir vivo. Não, nunca experimentei essa solidão que falava a Lurdes, a empregada velhinha dos meus avós, quando se referia ao marido vivo, que sempre achei defunto nas suas palavras. Não, não sei o que é a sensação erma da aldeia vazia, não sei o que é querer partilhar e não ter com quem. Já me senti vagamente sozinha. Daquele jeito só e no pior jeito acompanhado. Mas sempre a solidão breve, aquela que se faz adivinhar pesada, só de pensar que possa querer durar, vingar e vencer. A solidão é um desespero em vida, é uma antecâmara da morte, é um bicho, um monstro e um papão. Estar sozinho ou querer estar só, não é viver na solidão. Viver na solidão é sonhar com companhia. Olhar em redor e não ver mais do que os limites do nosso corpo.
Deus queira que nunca consiga escrever verdadeiramente acerca do tema, será talvez o sinal mais óbvio do quanto a fintei.