Amor, eu não estou feliz.

Já quis roçar contigo em todas as esquinas, arranjar desculpas estúpidas para me colar, deixar cair umas, apanhar outras. Fazer me encontrada no acaso do jardim. Ensaiar de te fazer sorrir. Alimentar-te como um abade, enaltecer-te como a meretriz de um imperador. Eu sou moderna, mas quando amo, abraço toda a antiguidade. Sou espadachim, poetisa, concubina e cozinheira xamã.
Agora sou pouca coisa. Contenho-me, porque a pele não arrepiar e os teus dedos escorregam devagarinho quando te dou a mão. Se poisar a cabeça no ombro, corro o risco de ter o torcicolo mais doloroso de superar, aquele em que a alma fica suspensa num pescoço degolado, pendurado no vazio.
Estamos em queda livre amor.
Talvez seja um daquele ciclos que falam. Mas custa tanto a inoperância de só deixar passar. O desespero por uma Maria Madalena, um pano ensopado em vinagre ou um sinal de Deus.
Para os apressados é a forma mais ignóbil de tortura, é o bypass com a criança, que não suporta a ideia do Amanhã. Amor, eu sou dessas, tão dona de si mesma, e a perder a pouco e pouco, o gosto que tenho por mim. Sinto-me a soprar para ver chama no vulcão.
O amor é fodido já dizia o MEC, e eu não me importo de me ir fodendo, o que eu não suporto é este travo a imposto que cai quando não estás recheado.Um IUC sem liberdade de circulação.
Sou tão melhor a ser feliz. Eu sei que às vezes arrefece o que antes aquece, que o que surpreende também se torna repititivo, que as velhas palavras são secas de útero e que não há piadas novas para a progressão.
Que vamos ficar todos tão gordos como obsoletos. Que a luta contra a gravidade é uma ilusão para o que é verdadeiramente grave.
Originais somos todos no princípio.Eu sei montes de coisas destas, e sinto um infinito mais.
Mas quando eu te dou a mão, aquece-a. E não é q eu não saiba viver sem ti, é só que eu não quero. Que se afoguem primeiro os monstro.
Eu tenho feitio de náufrago, fui há muito tempo, deixada para lá do alto mar.

Amor, eu não estou feliz.
E eu sei que é verdade, porque quando eu começo a rimar é o Maestro da alma que avisa que o concerto vai terminar.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *