Parentalidade

Positiva ou negativa, sobretudo muito honesta.
Quando fui mãe percebi rapidamente que a vida era para além de incrivelmente incerta, absurdamente formatada, um loop geracional de traumatizados e traumatizadores.

Cada um tenta eliminar o nível de trauma do seguinte, tornando a experiência de vida o mais agradável possível ou o menos amargurada.
Mas que fique claro, pelo menos para mim, que sigo alguns destes especialistas, que considero que o processo é sempre bidirecional.
Que há uma responsabilidade partilhada. Quando se cria um filho forma-se uma mãe.
Quantas crianças sabem disto? Para além da mera curiosidade sobre os auspícios da reprodução, quem lhe fala abertamente do parto de um pai e de uma mãe? O que sabem eles dos nossos ajustes, da ternura com que abrimos mão da liberdade, das dúvidas constantes, dos medos, da responsabilidade, do pânico da vida, da dor de existir para assistir e cuidar.

Não os poupamos com o nosso silêncio, sobrecarregamos-nos com o peso da tarefa. A família é uma sociedade somos todos acionistas da felicidade e do caos comum.

E a dádiva da vida, nós sabemos, permanece muito para além do rebentar da bolha, a vulnerabilidade do cuidado de quem depende também. Mas isso é uma parcela da equação e sempre em crescente em direção à galáxia da autonomia.

Mas não conheço ninguém verdadeiramente autónomo que não assuma como compromisso social e moral a co-responsabilidade.

Somos todos contribuintes para um eco sistema de felicidade. E é nosso dever explicar aos filhos que a energia é circular.

Quando me irritava muito com elas dizia, na verdade, ainda digo: “Alguém vai sair daqui traumatizado e não sou eu.”

Com esta frase encerrava o meu círculo de traumas. Sacudia a poeira da responsabilidade e sentia-me uma mãe adolescente em crise existencial sem pactos com o pudor e com o silêncio.

Hoje, posso dizer menos vezes, mas sinto-o em cada neuro transmissor. Parte do meu legado também é trauma e dor. Em redomas, nem as rosas.

Ensinou-nos um pequeno principezinho:

“O Amor é a única coisa que cresce à medida que se reparte.”

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