“Que curto que isto é.”

“Que curto que isto é.”

Achas que eu não sei?
Uma bainha de vida que deixa os joelhos todos à mostra.
Eu sei Maria.
Eu sei.

É tudo muito de repente.
O aneurisma, o ciclista, o motorista e o miocárdio.
E os meninos ficam com quem esta noite?
E o Coiso que vai ficar na marquise a miar?

Deves ter muita confiança na vida para pores o lombo a descongelar!

E tu Maria?
Que te queixavas de ser pequena e agora só te queixas que a vida é diminuída.
Já viste que caiu tanto ramo na estrada e nenhum te acertou?

Tu não te ponhas ao vento.
A Tia Jesus dizia a duplo queixo, que ninguém morria de corrente de ar.

Também nunca gostaste de gente com nomes canónicos, nem de pessoas que caem de repente aos nossos pés.

E agora é tudo súbito menos a alegria de por cá andar.
É curto, é Maria.
É curto também de vistas, que quando bem vistas, ainda deixam tanto por adivinhar.

E lá vamos nós de repente, sem o entendimento, que mais tempo houvesse e tudo repetíamos.

Cai o andaime, solta-se a corrente, do derrame à septicemia, do caroço à quimio.

Ah pois é Maria.
A morte é uma ancestralidade superior à vida.

Não é a vida que é madrasta, é a ceifeira, a quem falhamos na gratidão humana de lhe chamar mãe.

Ainda falta para findar o dia.

Queres ver que é hoje?
Se te fores Maria, assobia lá de cima par eu ir a trás.

Não quero ser fruto do acaso, maiúscula de um acidente, que me levem de voluntária morada para o umbigo da vida.
Isto é tão curto, não é Maria?

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