
Não fotografo muitos casamentos.
Nem tenho forma possível, de garantir que os que fotografo duram até ao fim. Sei que se pudesse, incluía no Pack dos serviços um voucher para a eternidade.
Gosto de pensar, falar e escrever sobre o Amor, mas é difícil adjectivar uma palavra, que se auto-define de forma tão hermética, que cada um tem a liberdade certa, de o sentir à sua maneira, sem que esta nunca perca o direito de se chamar assim, Amor.
Hoje num almoço com um grande amigo, trocávamos opiniões sobre o divórcio. O divórcio não vive nos antípodas do amor, mas por norma acontece quando alguém deixa de amar, embora a sequência de acções que o desencadeiam, seja muitas vezes, de índole menos nobre, que a pura escassez do sentimento. Quer eu, quer o meu amigo, somos filhos honrosos da triste estatística. Cada um com a sua valsa, cada um com a sua história, cada um dono da sua narrativa, maestro ou orquestrante do seu fim.
Não se perdoa uma vida sem amor, por isso é tão fácil de encetar uma conversa sobre um relacionamento, copulando-a convenientemente à drenagem do sentimento.
Sou uma liberal, serei sempre uma liberal, no sentido mais moralmente lato da definição. A que permite que o ser humano seja senhor do seu destino, da sua liberdade e da pureza das suas opções, mesmo que algumas sejam inconvenientes à conveniente felicidade dos outros.
Não sei qual é o recheio do amor, tenho sempre medo de o partir, mas tenho a certeza que há um inquilino gigante que vive lá dentro, a Verdade. E mesmo quando a verdade dói, ela é sempre merecida, nem que seja apenas, porque é pura e limpa, como o amor que move os homens, que se movem pelas melhores razões.
Hoje ao almoço, liamos numa estatística da Pordata (INE-DGPJ/MJ) que em 1960, 1% em cada 100 casamentos acabava em divórcio, e que em 2013 esta percentagem disparou para 70,4%.
Com alguma ingenuidade poderia acreditar, que isto só aconteceu porque as pessoas são mais verdadeiras, mas a vida já me lavou os olhos.
Também não acredito na voz monocórdica, do arauto da desgraça, que apregoa o síndrome do egoísmo, os vícios da sociedade moderna e as tentações da era digital. Acho que nunca saberei bem porque é que o amor acaba. Mas é sempre uma morte que me entristece.
Porque é que há casais que se enroscam no enlace narrativo da vida, até velhinhos? E outros, que se desenroscam na primeira curva apertada da vida? O que sei, é que cada vez que vejo dois velhos apaixonados, invejo-os. Mesmo ignorando, que se conheceram numa excursão ao Machu Pichu no verão passado.
O amor não é uma opção, é um sentimento. Não se faz download, nem upload de novas versões. Nem se desinstala, só porque se quer. Ele vem quando quer, e parece que parte da mesma maneira.
E se às vezes não parte, acho que é porque a vida deu a esses sortudos, o engenho do melhor nó da vida, o mesmo com que se amarra uma mãe a um filho.
Um dia, também vou ser uma velhinha agarrada ao meu velho. Também eu, farei as delícias da juventude em turismo, na digestão de um almoço angustiante.
E nessa altura, o peso leve do meu corpo envelhecido, não vai sentir o peso profético da estatística.
Serei só eu e tu, na “insustentável leveza do ser”, com um recheio de verdade, e um nó feito para a eternidade.
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