E se isto cair

…e eu ainda não afirmei o meu lugar no mundo, não se faz.
O meu sentido de propósito, o crescimento das minhas filhas, as castas que não conheço, os orgasmos em suspenso, os países que prometiam tanto, a festa da primavera que planeámos fazer, os carabineiros grelhados e a conversa nua com as irmãs.
E no entretanto, esta merda treme e eu suo das mãos. Nem sei como me deu para escrever.
Não há nada a fazer.
Não posso terminar o meu livro nas notas antes do embate com o mar. Não há rede, nem lá em baixo para nos segurar, nem nos telemóveis, para dizer às pessoas que fizeram o favor de nos aturar que gostamos delas e desculpem “qualquer coisinha”.
Dizemos que não temos tempo, mas o pássaro gigante treme e imediatamente pensamos em tudo o que ainda queremos sorver. Temos tempo, temos tempo, pousem os pés na terra sff que eu quero chão. Não peço garantias, quero oxigénio e unidades temporais para execução.
E se isto cai?
Quem vai dar conta e alma ao caos do que deixo para trás? Os meus Blocos apinhados de poemas inacabados, como a vida. Mas eu não quero ser estrofe por concluir, eu quero no mínimo uma trilogia.
Mesmo que o mundo não precise, preciso eu de partilhar com o mundo. Queria tanto levar-vos mais vezes nas asas do meu devaneio. Agora acalmou. Ufa!
Já não tenho tanta pressa outra vez. Só quero chegar a casa e comer uma sopa, arranhar uma lasca na minha pata de presunto, um beijo demorado.
Mas se isto cai, é um desatino, nos escombros vão encontrar palavras soltas, umas dobradas pelas fraquezas, outras inteiras nas suas virtudes.
De mim?
Nada se saberá de tudo o que eu sonhei que se soubesse. Comigo morrem os meus heterónimos, as minhas conspirações e as minhas manias. Não abanes tanto. Pousa devagarinho. Deixa-me concluir este poema.